sexta-feira, 30 de julho de 2010

The Sign

A mudança de setor fez-me um bem muito maior do que esperava. Além de proporcionar-me uma maior tranquilidade e ser mais vantajosa em vários sentidos, deu-me mais tempo ainda para pensar e construir idéias sobre as coisas que ouço, vejo e sinto.

Isso porque passei a laborar em ambientes, não muito... hum, digamos... seguros. Barreirinha, Maracanã e Guaraituba são terminais um tanto temidos pelas tantas desgraças que volta e meia lá acontecem.

Esse tipo de lugares, além daqueles pelos quais circulo diariamente, aliados à expansão da violência urbana, me levaram a engendrar, já há algum tempo, a idéia (tanto óbvia) de que o aumento da criminalidade está diretamente associado à proliferação das pichações.

Não apenas porque, sem dúvida, a pichação seja um crime, por caracterizar-se como a destruição/descaracterização de um patrimônio (ainda que meu ex-professor de Direito Penal afirmasse - caduca e veementemente - que não). Ainda, porquanto se presta a demarcar o território dos infratores e a deixar mensagens de desafio entre facções rivais.

Mesmo que muitos pichadores defendam que seus "desenhos" são meramente uma obra de arte, isso demonstra estar muito longe da verdade se observarmos alguns fatores. As pichações sempre levam uma assinatura e, com ela, uma mensagem: "eu mando aqui, essa área é minha, você vai se ferrar se aparecer por essas bandas". Assim como uma frase que eu vi num muro do Terminal Maracanã hoje, que dizia mais ou menos assim: "Vocês só picham na vila, aqui vocês não vêm".

Como corolário lógico disso, os lugares mais abandonados são os mais pichados, visto que, claramente, são os deveras disputados pelos comandos criminosos. E, à medida que a violência avança em determinado bairro, mais as pichações se espalham. Basta ver em bairros recentemente assombrados com tal problema... nos terminais de ônibus desses lugares... entre outros.

Isso era o que deveria pautar as ações policiais. Aqueles que sabem interpretar esses símbolos poderiam colaborar... enfim. É uma espécie de mapa da mina enterrado na areia da praia.

"I saw the sign
And it opened up my eyes
I saw the sign"

Chega de viagem na maionese.


Hora dos "causos" do transporte coletivo:

I

Terminal do Barreirinha, dia 19/07/10, lá pelas 14:00h. Primeira vez que eu trabalho nesse lugar. Nunca os tubos tinham sido lavados durante a tarde. Pois bem, nesse dia, eles foram. Dá-lhe embarcar neguinho pela porta de emergência, desviar ônibus, aguentar gente reclamando e, ao mesmo tempo, resolver problemas e anotar todos os números dos ônibus em operação. Inveje-me, Superman!
No mesmo dia, logo que um veículo entrou no Terminal, o motorista me chamou. Contou-me que a pessoa subiu no ponto inicial e foi até ali, descobrindo apenas ALI (claro!) que estava sem dinheiro ou seu cartão estava zerado...

II

...mal sabia eu que isso iria se repetir durante quase o RESTO da semana. Terça, quinta e sexta, pelo menos uma vez por dia. Mandei voltar quase todo mundo.

III

Isso fora os corridões que os cachorros se davam uns aos outros em certas horas do dia. Fora o menino deficiente mental que queria que eu ferrasse com todos os motoristas. Fora a Letícia vindo me visitar e incorrendo naquelas conversas cheias de ironia, como sempre, além de levar a irmãzinha dela, que ficava me cobrando o meu serviço.

IV

Terminal Maracanã, terça-feira, 30/07/10, 16:05h. Estava eu a cuidar dos Colombo/CIC, alguns dos quais atrasados, quando observo o 18R43, linha Cabral/Guaraituba, parado, e outro (cujo número me escapa) atrás dele. Pensei comigo que já estavam "comboiados".
Uns 10 minutos depois, um dos porteiros vem me contar, pura e simplesmente, que o motorista havia discutido com um passageiro. Logo após, um oficial da guarda municipal de Colombo vem me chamar para que eu acompanhe a situação.
Chegando lá, conversei com o passageiro e, logo após, com o condutor. Resumo da ópera: o usuário foi tentar subir no ônibus lotado e acabou prendendo seu pé na porta. Foi reclamar com o condutor; ambos discutiram e, sabe-se lá porque, o motorista pegou um martelo de bater pneus e atingiu o rosto do passageiro. Diz este que foi do nada (ahan, sei!), diz aquele que este foi agredi-lo antes (parece mais plausível). Resultado: ônibus parado por uma hora e catorze minutos, ambos encaminhados para a delegacia pela PM, rendição dos operadores, viagem cortada, reinício lá no Guaraituba às 17:44h. Coisinha de nada!

V

Dia 28/07, quarta, 12:53h, veículo HL107, linha Colombo/CIC. Pegava carona com ele para ir até o Terminal do Maracanã e ia conversando com o motorista quando, ao trafegarmos pela Av. Pref. Erasto Gaertner, pouco depois do 27º BLOG, um Uno Mille que trafegava pela faixa da esquerda, a uns 100 m de nós, resolve dar a vez a outro que estava querendo entrar em sua frente, freando do nada e sem dar qualquer sinal de pisca-alerta. O motorista percebeu, segurou um pouco no freio e depois pisou com tudo... veio todo mundo para frente e eu falei "vai bater, segure o freio!"
Faltaram 5 cm para a cagada. Foi por muita sorte, milagre, ou a que quiser que seja de sobrenatural.

VI

Melhor sorte não assistiu ao motorista do 18L48, também da linha Colombo/CIC. Às 17:11h do mesmo dia supracitado, chegou vomitado e teve de lavar o carro ligeiro. Hoje, vim com ele. Na viagem seguinte, "abriram a marmita" de novo e teve de sair com itinerário "recolhe" para lavar no posto mais próximo. Na próxima, um carro raspou-lhe toda a lateral. Esse sim teve um dia bom!


Poema do dia:

Dom Quixote

Voar em meio à lama
Sorrir ante os problemas
São coisas de quem ama
Seguir os prontos lemas

Deixar-se ao Deus dará
Dando-se só ao que deixam
Cair da mesa farta
Aqueles que se queixam

Pois quem cedo desiste
E logo é conformado
Faz-se feliz, se triste
Satisfeito, se esfaimado

Quem vence é quem persiste
Com vontade e equilíbrio
E não meramente insiste
Sem óculos, no colírio

Cristiano Tulio - 28/07/2010

domingo, 11 de julho de 2010

Space And Time

Nesses últimos tempos, muitas coisas têm sido objeto de reflexão para mim. Algumas mais difíceis de vencer, como os dois derradeiros posts; outras, objeto de teorias sobre as coisas ou pessoas.

Pensava eu, há uns dias atrás, sobre como se deu a evolução da sociedade através dos tempos. E, assim como Fustel de Coulanges centralizou a sua idéia sobre a cultura funerária, por assim dizer, concluí, num primeiro momento, que a organização social se deveu, em grande parte, a um fator: a covardia.

Nos primórdios, os homens caçavam e pescavam, como se sabe. Aqueles que tinham maior porte físico, em geral, saíam-se melhor do que os demais... e, também, podiam adquirir, mediante coerção, o que os semelhantes conseguiam.

Dado isso, a solução foi a organização em hordas, chefiadas por um líder, geralmente o mais forte. Entretanto, tais grupos passaram a saquear outros grupos... o que exigiu a criação de exércitos. Isso ensejou a vinda dos reinos, Estados e afins.

Em outras palavras, e falando bem rasamente: a concepção de mecanismos de controle e organização sempre foi destinada a frear o excesso dos mais fortes, de uma ou outra forma. Assim, serve para desencorajar a covardia.

Por outro lado, curioso perceber que uma eventual subversão desses sistemas - que, de inibidores de atos opressores, passaram eles mesmos a servir de instrumento para iguais injustiças, mormente nos tempos atuais - é tida como um ato de coragem, pois o que servia para afastar a injustiça, num primeiro momento, agora se presta a facilitá-la, dependendo do uso que disso se faz.

"There ain't no real true
There ain't no real lie
Keep on pushing cos I know it's there"

Acho que vou escrever um livro. Não vai vender qualquer exemplar, mas uma viagem como essa não perde para muitas das coisas que já vi nas prateleiras de algumas livrarias.

Causos do transporte coletivo:

I

Primeiro dia na nova função. Terminal do Boa Vista, 04/07/10, lá pelas 16:30h. Concentro-me em fazer nada, pois o lugar em questão é praticamente morto aos Domingos. Lá pelas tantas, ouço um piá relatando para um grupo de outros moleques uma cantada que tinha passado:

- Não, cheguei na "mina" e perguintei pra ela: "você tá vendendo bala?" Aí ela disse: "não, por quê?" e eu "e esse pacotinho aê?"

Mal sabia eu que as coisas podiam piorar...

II

...porém, sempre podem. Na Segunda, 05/07, no mesmo Terminal, às 17:56h, um biarticulado Sta. Cândida/C. Raso (não me lembro o prefixo, só sei que era BDxxx) fica com a porta 5 travada por alguns minutos. Logo destravou e saiu do lugar, para meu alívio...

III

...que não durou muito. Terça, 06/07, ainda lá, às 17:58h, o biarticulado VD984, da linha Sta. Cândida/C. Raso, apresentou problemas na caixa de câmbio e simplesmente travou na plataforma. Ótimo horário para tanto, visto que já havia outros três atrás dele. Resultado: desvios pela contramão e por fora do Terminal, embarques pela porta de emergência, pessoas perdidas... depois de longos e tenebrosos 20 minutos, o ônibus conseguiu sair dali, o que causou o meu atraso para o futebol das 19h.

IV

Mas a semana ainda não estava completa. Quarta, 07/07, às 17:12h, a luz caiu em metade da cidade. As catracas pararam de funcionar e, de novo, problemas para resolver. Pensava se até o final de semana as profecias de Nostradamus se concretizariam...

V

Até que veio a Quinta, 08/07. Uma mulher exigiu de mim que tomasse alguma providência quanto aos cachorros que habitam no Terminal, visto que eles tencionam morder os transeuntes. Claro, vou adotá-los e levá-los para casa só por que ela quer... afinal, eu sou um tanto altruísta.

VI

Por fim, hoje, já saindo do serviço no Terminal Sta. Cândida, lá pelas 18:40h, enquanto passageiro do veículo BA139, linha Sta. Felicidade/Sta. Cândida (carinhosamente conhecida como "Santa-Santa", dada a sua curtíssima extensão), um "mano" meio cuzido/chapado entrou pela porta dos fundos do carro ali na altura de Alm. Tamandaré. O cobrador logo viu e tratou de avisar o motorista, que, após andar um pouco, parou. O cobrador então dirigiu-se ao elemento e pediu que ele colaborasse. Aí resolvi intervir. Fui até o invasor e travamos o seguinte diálogo.

- Ei cara, 'bora pagar a passagem lá.
- Tá falando comigo?
- U-hum.
- Tá, então já vou te pagar.

E, ficou de pé na minha frente, de costas para mim. Começou a mexer no bolso perto da cintura, e eu, que nada via, já achei que ia levar um balaço na testa ou algo assim. Segundos de tensão até que ele, singelamente, sacou da algibeira uma moeda de um real e ma deu. Logo falei:

- Agora passar lá pela frente.
- Tão tá bom.

Passou e, como eu agradecesse a atitude, até se desculpou com um "foi mal". Belo desfecho para quem imaginou não chegar ao final da viagem vivo... morra de inveja, Indiana Jones!


Poema do dia:

Sem Saber Muito Mais

E quando a chuva todo me molhar
Eu vou sentir em mim o Sol arder
Pois quando o frio intenso aparecer
É que fará a extensa luz brilhar

Pois, o que ouço, nem vou apreciar
Quando o que eu digo é que faz valer
Os dias, tardes, qual o anoitecer
Não vão além do que eu acreditar

Forma de ver
De interpretar
O que você
Pode tentar
O amanhã vem sem saber muito mais

Do que não sei
Resta esperar
O astro-rei
Se levantar
Trazendo a guerra pela nossa paz

E se o relógio, logo mais, parar
Trará a muitos toda a perdição
De não poder fingir toda a razão
Que imaginamos poder controlar

Pois, o que vejo, nem vou tencionar
Ter como o verdadeiro do que vai
Sem ter limite ou retornar jamais
Do que a minha imaginação criar

Cristiano Tulio - 11/07/2010